O sol de Ponta Porã começa a se inclinar no horizonte, tingindo o céu com tons de laranja e púrpura, enquanto a brisa quente acaricia a varanda da sede da fazenda com um sussurro de erva-mate e terra seca.
Após algumas horas de espera, com os rostos ainda cobertos por véus e talits que filtram a luz celestial, Madm, Amada, o pequeno Bebeto, Luk, Healer, Menslike e Nokram sentam-se em cadeiras rústicas, os corações pulsando com uma mistura de ansiedade e gratidão.
À sua frente, os capatazes Aparício, Duck e Faustão observam com uma curiosidade cautelosa, enquanto uma bela jovem albina move-se com graça entre eles, servindo tereré — uma bebida refrescante preparada com água gelada e erva-mate, cujo aroma fresco enche o ar.
Madm conta sobre as experiências vividas, emocionado, com olhos que beiram lágrimas de emoção.
Amada complementa a narração de Madm com suavidade, descrevendo a renovação de seus corpos e a certeza que os guia, enquanto Bebeto, com olhos arregalados, murmura sobre os cânticos celestiais que ainda ecoam em sua memória.
Luk, Nokram e Menslike acrescentam detalhes sobre as perseguições superadas, e Healer fala da esperança que os sustenta, unindo o grupo em uma narrativa que mistura assombro e propósito.
Aparício, o chefe dos capatazes, franze a testa, os olhos semicerrados, revelando ceticismo, como se tentasse decifrar uma ilusão. Duck, por outro lado, inclina-se para frente, com rosto iluminado por uma curiosidade infantil, enquanto Faustão, o pastor evangélico, ouve com a boca entreaberta, impressionado com cada palavra.
Após um silêncio tenso, Faustão indaga, com voz tremendo de esperança:
— Então, vocês podem curar qualquer um de nós de qualquer doença?
Madm sorri, com coração aquecido pela confiança no Altíssimo, e responde com convicção:
— Está é a promessa de Deus! E cremos que ele nos honrará.
Duck, apontando para Kilba com um gesto hesitante, pergunta:
— Então, você pode curar Kilba, que é albina?
Kilba, servindo o último copo de tereré, interrompe com um tom irritado, os olhos flamejando:
— Curar do quê? Eu não sou doente!
Menslike, observando a jovem com admiração, intervém com sutileza:
— Verdade, não tem do que se curar.
Madm, segurando o cristal com mais firmeza, explica com calma, refletindo sobre suas palavras:
— O albinismo é uma mutação genética, logo, não sei se é algo que necessite de cura.
Kilba, cruzando os braços, insiste com veemência:
— É, não preciso de cura!
O grupo ri baixinho, aliviando a tensão, e continua a conversar, o som do tereré sendo sorvido misturando-se ao crepitar distante de um fogo na cozinha. De repente, o ronco de uma caminhonete Chevrolet Brasil corta o ar, aproximando-se com poeira, levantando-se em sua esteira. Aparício levanta-se rapidamente, a voz tensa:
— É o chefe!
Amada abraça Madm, os corpos unidos em um gesto de apoio mútuo, enquanto o coração dele acelera com a expectativa. Juntos, eles aguardam, os véus cobrindo seus rostos brilhantes, quando Thomaz Muller freia bruscamente, abrindo a porta com um rangido metálico. Aparício corre ao seu encontro, as mãos gesticulando:
— Desculpe incomodá-lo, chefe, mas aconteceu algo muito estranho.
Thomaz, um homem robusto com traços endurecidos pelo sol, desce da caminhonete e pergunta, a voz rouca:
— O que foi?
— Vimos um clarão no meio do matagal, quase no fim da fazenda. Quando chegamos lá, encontramos esse pessoal — cinco homens, uma mulher e uma criança cujos corpos brilham e afirmam ser anjos de Deus. — explica Aparício, apontando para o grupo.
Thomaz, quase sem acreditar, aproxima-se com passos lentos, com olhos estreitados, avaliando-os. Ele pergunta com voz carregada de dúvida:
— Vocês são anjos?
Nokram responde rápido, com um tom direto:
— Não!
Menslike, sorrindo para Kilba, que abaixa a cabeça com vergonha, acrescenta:
— Mas somos enviados de Deus!
— Enviados de Deus? Obrigaram vocês a taparem vossos rostos? Por favor, tirem esses panos de vossas faces. — pede Thomaz, inclinando-se para ver melhor.
Madm e Amada trocam um olhar preocupado. Imediatamente, todos ao redor fecham os olhos e tampam os rostos, e Madm adverte, com voz firme:
— Melhor não, pois isso poderá machucar as vistas de vocês.
Thomaz, desafiando a cautela, insiste:
— Se são anjos, não me farão mal, correto?
Menslike, com uma ousadia que faz seu coração disparar, é o primeiro a tirar o véu, com olhos brilhando com intensidade. Healer e Luk se entreolham, desaprovando com um franzir de sobrancelhas perceptível, mesmo através do véu, mas antes que possam reagir, o olho de Thomaz arde e ele grita, cobrindo o rosto.
— Por favor, coloque novamente. Agora!
Atendendo ao pedido, Menslike cobre o rosto novamente. Impressionado, Thomaz respira fundo e gesticula para que o sigam:
— Venham comigo para meu escritório.
Na sala de madeira rústica, com paredes adornadas por troféus de caça e o cheiro de couro no ar, todos se assentam em cadeiras duras. Thomaz, ainda intrigado, indaga:
— Quem? E o que são vocês?
Madm olha para Amada, pega suas mãos com ternura e diz, com voz cheia de certeza:
— Somos de outra realidade, fomos enviados por Deus para esta realidade para auxiliá-los.
— Vocês são anjos de Deus? — Pergunta Thomaz, coçando a barba.
— Se você considerar que anjos são mensageiros enviados pelo Altíssimo, sim, mas somos humanos como você. — enfatiza Madm, apertando a mão de Amada.
— Como assim? — Insiste Thomaz, inclinando-se para frente.
— O senhor talvez não acredite, mas existem incontáveis realidades paralelas distintas e semelhantes entre si, que coexistem paralelamente neste universo. Em uma delas, o Mashiach efetuou seu julgamento primário e nos escolheu para vir para esta realidade com uma missão: trazer sua mensagem e proclamar a boa notícia de tudo que conhecemos, a todos. — Responde Madm, com olhos brilhando de emoção e entusiasmo.
Thomaz Muller coça a cabeça, confuso, e questiona:
— E vocês vieram até mim?
Madm olha para Amada, que responde com um sorriso sereno:
— Parece que o senhor foi escolhido por Deus para nos receber! Por algum motivo, o Altíssimo te achou especial!
Thomaz sorri, um lampejo de orgulho cruzando seu rosto, e pergunta:
— E como vocês poderão salvar nosso mundo, se nem podemos olhar para vocês?
— Não viemos salvar o mundo, isso o Mashiach já fez e fará novamente. Viemos apenas compartilhar nosso conhecimento e buscar orientá-los segundo a lei de Deus. — Explica Madm, com a voz calma.
Confuso, Thomaz indaga:
— E como posso ajudar?
Madm e Amada se entreolham, e ele confessa, com voz vulnerável:
— Viemos para cá, temos apenas uma roupa, nossos rostos ainda brilham e não sabemos por quanto tempo brilharão. Não temos documentos nem identidade. Na verdade, não sabemos onde estamos e em que época.
Thomaz sorri, aliviado, e indaga com um toque de humor:
— Quer dizer que o rosto de vocês não ficará assim brilhando para sempre?
Amada antecipa, com um leve riso:
— Não sabemos!
Nokram, refletindo, completa:
— Creio que, assim como Moshe, a quem o senhor conhece como Moisés, após ver a glória de Deus, não ficou com seu rosto brilhando para sempre, nosso rosto deve deixar de brilhar dentro de algumas horas…
Nokram ainda está falando quando Healer o interrompe, completando com entusiasmo:
— Ou dias!
Thomaz, pensativo, indaga:
— E como posso saber se vocês não são ilusionistas? Magos?
Todos se entreolham, o silêncio pairando como uma névoa. Luk, após um momento, confessa com sinceridade:
— Não temos como provar, o senhor vai ter que crer ou duvidar.
— Ok! Vou pedir para reservarem alguns quartos para vocês. Fiquem conosco, me falem mais sobre Deus e me abençoem. — Pede Thomaz, a voz suavizando-se com uma mistura de curiosidade e respeito.
O grupo suspira aliviado, as mãos entrelaçadas, enquanto o futuro se desenha com incerteza, mas também com a promessa de uma nova aliança.