O sol paira alto sobre Ponta Porã, tingindo com vigor o céu com nuances de laranja e ocre, enquanto o vento quente sacode a poeira das estradas sinuosas. Duas viaturas cortam o caminho em direção à delegacia, a primeira liderada pelo Capitão William, com Madm, Amada, Nokram e Menslike a bordo, enquanto a segunda transporta Luk, Healer e Bebeto, escoltados por Anderson e Swan. O silêncio dentro da viatura dianteira é quebrado por William, que, ajustando o retrovisor, pergunta:
— Me conte mais sobre vocês. Como conheceram o Sr. Muller?
Madm, hesitante, encara Amada antes de responder:
— Se eu te falar a verdade, o senhor vai me achar louco.
— Diz aí. — Insiste William, com um tom de sarcasmo na voz.
Diante da ironia, Madm indaga:
— O senhor me permite pegar algo em minha mochila?
William pausa com os pensamentos girando: “Que vacilo o meu, nem revistei a mochila dele. E se esse sujeito puxa uma arma?” Com a mão esquerda deslizando para a arma no coldre e a direita firme no volante, ele sinaliza ao motorista do carro de trás com um olhar e diz:
— Mostre!
Madm abre a mochila com cuidado, revelando o Cristal do Conhecimento, e explica:
— Nós não conhecemos perfeitamente o Sr. Muller. Não somos daqui, somos de outra realidade. Fomos enviados pelo Mashiach para mudarmos a história deste povo.
William solta uma risada seca, balançando a cabeça:
— Eu quero te ajudar, mas se você continuar sendo sarcástico e irônico comigo, certamente eu vou ser o primeiro a querer ferrar com sua situação ao passar o seu caso para o delegado.
Ignorando o tom, Madm ergue o cristal e propõe:
— Pegue! Faça qualquer pergunta ao cristal, tocando nele. Qualquer coisa sobre mim ou sobre o mundo.
William franze a testa, mas sinaliza para a viatura de trás diminuir e para o veículo. Na segunda viatura, Bebeto, inquieto, pergunta:
— O que ocorreu?
Anderson, ao volante, responde com calma:
— Fiquem tranquilos, o Capitão solicitou que parássemos. Nada grave.
Swan, no banco do passageiro, indaga:
— Quer que eu desça?
— Vamos aguardar a orientação do Capitão! — enfatiza Anderson, mantendo o foco na estrada.
Com as viaturas paradas, William pega o cristal, o peso da pedra fria em sua mão, e adverte:
— Se você estiver de brincadeira, eu não medirei esforços para te ferrar. E tenha certeza que nada que Thomaz Muller fizer vai aliviar para você.
Madm mantém a compostura:
— Faça apenas o que sugeri!
Nokram, ao lado de William, intervém com voz firme:
— Confie em nós, capitão!
Respirando fundo, William pergunta ao cristal:
— Quem é este casal que aqui está?
Imediatamente, uma visão inunda sua mente. William pisca e vê Madm e Amada, idosos, fugindo, perseguidos por autoridades de túnicas escuras, o som de passos e gritos cortando a noite, ele não os reconhece, então, ele vê um clarão no céu, um homem rodeado de seres celestiais, envolto em glória, julgando a Terra, que se abre e se consome com terremotos e maremotos, enquanto o grupo de Madm canta e escapa. De repente, ele vê o grupo rejuvenescer, mas seus corpos se tornam luminosos.
Ele finalmente reconhece Madm e Amada, mas a intensidade da luz o faz piscar e lacrimejar, então ele lança o cristal, derrubando o objeto nos pés de Nokram, que geme:
— Ai!
William, com os olhos avermelhados e com dificuldades para enxergar, limpa seus olhos e grita:
— Ninguém foge! Todos parados, senão eu atiro!
Sem se exaltar, Madm tenta acalmá-lo, ele toca seus olhos e, com seu polegar e seu dedo médio, de maneira que William percebe seu corpo relaxar e volta a enxergar.
— O que vocês fizeram? — Indaga o capitão de polícia, que, em seguida, pisca novamente, atônito, olhando para o casal.
— O que viu? — Pergunta Madm, curioso.
— Vi vocês fugindo das autoridades, mas vocês eram idosos. — Afirma William, com a voz trêmula.
— Só isso? — insiste Madm.
— Também vi vocês diante de seres iluminados, rejuvenescidos numa reunião em outro lugar, outro planeta, sei lá, mas eu acho que… por alguns segundos, eu fiquei cego. — Admite William, esfregando os olhos.
Amada, com serenidade, explica:
— O que o senhor viu foi a experiência que vivenciamos com o Mashiach, quando o mensageiro deste nos enviou para cá.
Massageando seus pés, Nokram explica:
— Quando vemos seres celestiais em sua forma cheia de luz, podemos morrer ou perder a visão. Nosso corpo não está apto a ver a glória de Deus, mesmo quando esta age sobre seres menores como nós.
— Como posso saber se isso é verdade? — Indaga William, ainda cético.
Madm pega o cristal de volta e propõe:
— Peça para eu perguntar qualquer coisa, qualquer coisa que só o senhor saiba, que mais ninguém saiba.
William reflete por um momento e diz:
— Pergunte ao cristal os nomes dos meus filhos!
Madm repete a pergunta, segurando o cristal, mas nada aparece. Ele tenta novamente, franzindo a testa. Amada, notando a expressão, pergunta:
— O que foi, meu amor?
— Não vejo nada. — responde Madm, perplexo.
Amada, perspicaz, sugere:
— Provavelmente é porque ele não tem filhos. Porém, não há uma pergunta que só o senhor saiba a resposta? Pois imagino que seus amigos devam saber esta resposta, e isso não é suficiente.
William solta um riso curto:
— Inteligente, a sua esposa.
Pensando rápido, ele propõe:
— Como eu conheci minha esposa?
Madm repete a pergunta ao cristal e descreve:
— Uma linda jovem loira de olhos claros, o senhor está vestido de segurança de um hotel quando ela passa por você sorrindo.
A expressão de William muda, os olhos arregalados:
— Que diabo de mágicos são vocês?
— Não somos mágicos, estamos dizendo a verdade. — Enfatiza Amada, com firmeza.
Menslike, inclinando-se para frente, acrescenta:
— Se o senhor não acreditar, nos leve à delegacia e inventaremos várias mentiras. Pois ao senhor e ao Sr. Muller falamos a verdade, porém, ao que parece, não estão acreditando.
William respira fundo, olha para o cristal, agora, nas mãos de Nokram, no banco do passageiro, e desafia:
— Eu vou pedir para você encher este amuleto de perguntas. Você vai ter que me dizer inclusive os números do próximo sorteio da loteria.
Madm, com um leve sorriso, responde:
— Tudo que o senhor exigir.
Enquanto isso, na fazenda, Thomaz Muller chama Kilba ao seu escritório, com o tom carregado de irritação:
— Ouvi falar que você estava dando moral para aqueles caras!
Kilba, os olhos brilhando de convicção, rebate:
— Aqueles moços são anjos, o senhor não viu como seus rostos brilhavam?
Thomaz, batendo a mesa, retruca:
— São mágicos, fizeram algum truque. Você acha que alguém que sirva a Deus fala contra a Igreja como eles falaram?
Kilba se cala, o silêncio pesa no ar. Thomaz se levanta, aproximando-se dela com passos lentos. Ele toca seu ombro, deslizando a mão até o braço, e a puxa suavemente para si. Seus lábios encontram os dela em um beijo, carregado de uma mistura de autoridade e desejo. O beijo é interrompido pelo barulho da camionete de Aparício, retornando à fazenda, com o motor ecoando como um trovão.